O Estatuto do Índio (1973), lei nacional em vigor sobre os direitos indígenas no Brasil, especifica que os índios e as comunidades indígenas ainda não integradas estão sujeitas a um regime de tutela pela à União (Art. 7). Também especifica que podem ser liberados desse regime de tutela e serem sujeitos de direitos civis e políticos (art. 5), os índios ou silvícolas que cumpram com as seguintes condições:

1.Maior de 21 anos,
2.conhecimento da língua Portuguesa,
3.habilitação para o exercício de uma atividade útil na comunidade nacional,
4.razoável conhecimento dos usos e costumes da comunidade nacional (art. 9).

O Estatuto indica que cumprindo esses requisitos, a pessoa indígena interessada poderá ser reconhecida como «integrada», e inscrita no registro civil, cessando quaisquer restrições aos seus direitos imposto pela tutela (art. 10). Quando a maioria dos membros de uma comunidade atender a esses requisitos, o Presidente da República poderá decretá-la como uma comunidade indígena emancipada da tutela (art. 11).

É importante considerar que o Estatuto do Índio não foi revisto no novo marco constitucional de 1988, embora há mais de 14 anos se tenha iniciado o trâmite no Congresso Nacional para atualizar este estatuto.

A Constituição Nacional e o Código Civil

A atual Constituição Federal reconhece as formas próprias de organização social dos povos indígenas, mas mantém o conceito de tutela pública, ou seja, a obrigação do Estado em velar pela proteção dos bens indígenas.

O novo Código Civil (Lei 10406 de 2002) prevê que a Fundação Nacional do Índio (FUNAI) fará a gestão do patrimônio indígena, a menos que seja demonstrado que o «grupo tribal» titular do patrimônio tenha «capacidade efetiva» para a gestão. Isso demonstra que ainda se mantém regras que sustentam a política tutelar do Estado brasileiro com relação aos povos indígenas.

O mesmo código prevê, no artigo 4º, que os povos indígenas não são mais relativamente incapazes e que uma legislação especial definirá as regras de capacidade específica para atender as particularidades da titularidade de direitos e deveres coletivos e individuais dos povos indígenas. Esta legislação especial, o novo Estatuto dos Povos Indígenas, não foi regulamentada até a presente data.

Do Regime Tutelar para a Autonomia Indígena

O direito dos povos indígenas à autodeterminação, ou seja, a controlar suas vidas e comunidades e participar em todas as decisões que os afetam, dentro da estrutura atual de unidade nacional e de integridade territorial de cada país, é regido no Brasil de acordo com a Convenção 169 da OIT, incorporada no sistema jurídico brasileiro e pela Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas.

Direito à justiça e Justiça Própria

De acordo com o Estatuto do Índio, o órgão federal de assistência ao índio (FUNAI) tem competência na defesa jurídica e extrajudicial dos direitos dos silvícolas e das comunidades indígenas (art. 35). Os grupos tribais e as comunidades indígenas são partes legítimas da defesa de seus direitos em juízo, cabendo a eles à assistência do Ministério Público Federal e da FUNAI (art. 37). Em casos de condenações penais, será tolerada aplicação, pelos grupos tribais, de acordo com suas instituições próprias, de sanções penais ou disciplinares contra os seus membros, desde que não sejam de caráter ofensivo, cruel ou pena de morte (art. 57).

A Constituição Federal Brasileira de 1998 estabelece que os índios, suas comunidades e organizações são partes legítimas para ingressar em juízo em defesa de seus direitos e interesses, intervindo o Ministério Público em todos os atos do processo (Art. 232).

O Direito aos Recursos Naturais

Atualmente está em vigor o Código Florestal (Lei 4771 de 1965) segundo o qual as terras indígenas são áreas de preservação permanente. De acordo com a Medida Provisória n º 2.166-67 de 2001 nas terras indígenas, somente as comunidades indígenas podem realizar o manejo florestal para fins de sua subsistência e o manejo deve ser sustentável. O manejo florestal sustentável é definido como «administração das florestas para obter benefícios econômicos, sociais e ambientais, respeitando os mecanismos de sustentação do ecossistema e, cumulativamente ou alternativamente, a utilização de múltiplas espécies madeireiras, produtos e subprodutos não madeireiros, bem como a utilização de outros bens e serviços de natureza florestal «(inciso VI do art. 3 º da Lei 11.284 de 2006).

Esta regra é contrária aos direitos dos povos indígenas ao livre aceso e administração dos seus recursos, limitando o uso destes recursos à imposição de um «plano de manejo florestal sustentável», que pode não coincidir necessariamente com os objetivos de desenvolvimento cada povo indígena.

De acordo com o Código Florestal (art. 16), territórios indígenas localizados no bioma amazônico tem a obrigação de manter 80% da cobertura florestal em seus territórios, e 35% da cobertura florestal nas terras indígenas localizadas na região definida como Amazônia Legal.

Não há clareza jurídica sobre a autonomia dos povos indígenas no manejo dos seus recursos naturais. No entanto, de acordo com a legislação internacional vigente no Brasil, o Estado não pode outorgar concessões florestais em terras indígenas, já que o usufruto dos recursos florestais é exclusivo das comunidades indígenas. O Estado deve respeitar e proteger os direitos dos Povos Indígenas à autodeterminação para escolher as opções de desenvolvimento que considerem melhor para si mesmos e para seus territórios.